Diariamente, 350 toneladas de resíduos sólidos urbanos são geradas na cidade – 100 toneladas a mais do projetado pelos especialistas no início da década
14/07/2020 | 11:07:50
Quantas vezes você já parou para pensar sobre a quantidade de lixo que produz? O número e o tipo de embalagens que consome; os hábitos que adquiriu ou herdou com o tempo em relação a isso; e como este seu estilo de vida pode estar contribuindo ou prejudicando o meio ambiente e o ecossistema no qual você está inserido. Neste caso, pensar em si, é pensar no coletivo, e refletir sobre o presente é também uma forma de vislumbrar o futuro, uma vez que compartilhamos o mesmo planeta e dependemos da sua sustentabilidade para sobreviver.
Uma das maiores preocupações na área ambiental, atualmente, é a evolução exponencial – e preocupante, segundo especialistas – da geração de resíduos sólidos urbanos, ou seja, a quantidade de lixo que cada um de nós produz todos os dias. Em Pelotas, 350 toneladas chegam à Estação de Transbordo do Sanep diariamente – 100 toneladas a mais do projetado para 2020, pelo Plano Municipal de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos, feito pela autarquia em 2014.
De acordo com o estudo, em 2020 a cidade deveria gerar 249 toneladas de resíduos urbanos por dia considerando a sua população e, somente em 2030, quando o número de habitantes deve equivaler a 365 mil, os pelotenses produziriam 348 toneladas – índice já superado uma década antes disso. Na prática, isso quer dizer que a geração de resíduos sólidos urbanos por habitante cresceu praticamente 100% em uma década, passando de 0,58 kg/dia para 1,01 kg/dia. Em situações pontuais e festivas, como o Natal, o município já alcançou picos de produção de resíduos de quase 450 toneladas por dia, quantidade prevista somente para 2038.
O coordenador do Departamento de Resíduos Sólidos do Sanep, Edson Plá Monterosso, explica que projetar o incremento da geração de resíduos é importante para que se planejem os investimentos necessários para executar e organizar os serviços de coleta e de destinação final nos anos seguintes. Mais do que isso, é essencial para avaliar como a geração atual consome e o que a próxima pode esperar no futuro.
Monterosso detalha que o Plano Municipal – documento que diagnostica a realidade do setor e define diretrizes para qualificá-lo – considerou dados populacionais e taxas de crescimento do IBGE, utilizando o método de crescimento geométrico e aplicando-os em uma fórmula matemática. Para a projeção da produção de resíduos foi utilizado um crescimento uniforme de 3,5% ao ano, que leva em conta, além do crescimento populacional, outras variáveis como as mudanças de poder aquisitivo e costumes da população.
O coordenador acredita que o crescimento exponencial não é apenas fruto do aumento da população, mas, principalmente, dos seus hábitos de consumo, e se preocupa com o crescimento desproporcional do número de habitantes em relação à geração de resíduos, que chega a ser até seis vezes mais acelerada.
“Somos a sociedade do consumo do descartável. De um tempo para cá, mudamos substancialmente nossos hábitos e percorremos um caminho muito perigoso, com uma produção desenfreada e assustadora de resíduos. Infelizmente, não temos uma perspectiva de reverter esta condição em curto prazo”, alerta.
Exemplos dessa recente mudança no comportamento das pessoas e da adesão a escolhas mais práticas – mas também nocivas ao meio ambiente – são as garrafas de refrigerante. Até poucas décadas atrás, eles eram adquiridos em vidro, o que permitia o reuso das embalagens, lembra Monterosso. Se a criação da garrafa pet fez com que o consumo por parte das pessoas se tornasse mais fácil e acessível, também refletiu no aumento significativo de resíduos descartados, assim como outros alimentos que, com a industrialização, fizeram crescer o número de embalagens plásticas.
Em pouco tempo, o meio ambiente se deparou com uma alteração radical na forma de produzir e consumir no mundo, com o advento da tecnologia e, consequentemente, da invenção de produtos que vieram para acompanhar os novos estilos de vida e necessidades humanas, como a fralda descartável – material que leva mais de 500 anos para se decompor.
“Ninguém está dizendo que o certo é retroceder e voltar ao uso de fraldas de pano, por exemplo. O que é necessário é um movimento de toda a sociedade a fim de que novas soluções sejam criadas e adotadas como uma resposta a essa nova forma de consumir”, opina Monterosso.
A resistência a novas alternativas e, até mesmo, preconceito com novas maneiras de consumir, para ele, são adversários para uma relação mais consciente entre o homem e o meio ambiente.
Fazer a opções por refis, embalagens retornáveis, plásticos biodegradáveis, papéis recicláveis já representam respostas eficientes e alcançáveis ao problema da geração exponencial de lixo. Algumas delas esbarram justamente na necessidade de quebrar paradigmas e no interesse de buscar conhecimento e trazer à luz questões do nosso cotidiano. “Exemplo disso é o papel branco. As pessoas até hoje têm restrições com o papel reciclado, acreditam em mentiras sobre a sua funcionalidade e qualidade. Mas poucas buscam saber que o processo de branqueamento é altamente poluente”, reflete.
Na contramão dos inúmeros gargalos a serem resolvidos, há também o engajamento de empresas, governos, organizações e cidadãos que já despertaram para a causa e mobilizam-se para alertar sobre a necessidade de aderir urgentemente a medidas sustentáveis que contornem a situação. São grupos e movimentos que se dedicam a enfatizar a importância dos conhecidos R’s da Sustentabilidade: reduzir, reutilizar e reciclar. Há ainda quem inclua neste conceito os termos respeitar, repensar, responsabilizar-se e recusar – no caso de produtos que desrespeitem a legislação ambiental.
Somente em 2010, por exemplo, que a lei federal 12.305 instituiu a Política Nacional de Resíduos, representando, oficialmente, um dispositivo regulatório para os resíduos sólidos que preconiza a não geração, redução, reciclagem, tratamento e a disposição final adequada ao meio ambiente. O relatório divulgado no ano passado pela ONG World WildlifeFund (WWF), voltado à poluição plástica, aponta que, aproximadamente, metade de todos os produtos plásticos que poluem o mundo hoje foi criada depois dos anos 2000 e que 75% deles já foram descartados.
A proibição do uso de canudos plásticos, a disponibilidade de copos ecológicos em estabelecimentos – substituindo os plásticos, que levam centenas de anos para se decompor –, a escolha da população por marcas e empresas que defendem o desenvolvimento são algumas amostras de que a humanidade já dá passos importantes para tentar reverter o consumo desenfreado do descartável.
A nível local, a prefeitura de Pelotas busca fazer mesmo, ao desestimular a população ao uso de sacos plásticos, inicialmente, em feiras orgânicas. Através do projeto Plástico Zero, lançado em maio, ecobags foram distribuídas aos consumidores, demonstrando que a sacola plástica pode – e deve – ser substituída para contribuir com o meio ambiente. O objetivo é que o desuso destes materiais, que podem demorar até 400 anos para se decompor, torne-se um hábito para os pelotenses e que ele seja a mola propulsora para mais práticas sustentáveis.
Do total de 350 toneladas produzidas na cidade, cerca de 280 são gerenciadas pelo Sanep. Além das 200 toneladas de resíduos sólidos domésticos coletadas diariamente pela autarquia – incluindo a destinação final dos recicláveis recolhidos na coleta seletiva – também chegam ao Transbordo outros tipos de lixos, como varrição e capina. A outra parte dos resíduos (entulhos, resto de obras, retirada de lixões) fica sob a responsabilidade da Prefeitura, através da Secretaria de Serviços Urbanos e Infraestrutura.